9/30/2006

Azedinhas



"Azedinhas"

A prata da casa

Estou nervosa. Já são exactamente 17.00 horas, e eu, ainda me passeio pelas ruas barulhentas de Lisboa. Mas gosto. O problema é que tenho de apanhar o comboio exactamente ás 18.55. Por isso, das duas umas, ou sou parva, ou sou descontraída. Descontraída nunca fui, por isso... Passando á frente. A minha taxa de nervosismo atinge sempre valores elevados, quando tenho de apanhar um transporte com hora marcada e bilhete comprado. Fico insuportável. Tenho dito.
Ufa! São 18.50, e eu já estou a olhar para a porta de entrada da minha carruagem. Suada me encontro, pois claro, os nervos não perdoam.
Entro, procuro o meu lugar, lá está ele, o belo 44, corredor. Sento-me, instalo-me confortavelmente, monto a tenda ... e lá estou eu pronta para uma estopada de 3.00 horas de viagem. No lugar 46, na janela, está um fulaninho, sentadito ao meu lado, com um ar sádico, e com um sorriso ligeiro. Aquele sorriso, aquela cara de estafermo, já irritava um santo. Mas eu não percebia o problema ... mas ele, com aquela cara/fronha ... bem, ele percebia de certeza.
18.55 lá arrancou o comboio, tudo bem. 19.04 pára outra vez. E pois claro, problemas. Aparece uma “lady” e diz:
- AH! Desculpe, esse lugar não é o 46, esta não é a carruagem 9? Pois esse lugar é meu. IMPORTA-SE? – diz a gaja, para o tipo do 46.

NÃO!!! e agora? Pensei eu para mim. “Como? IMPORTA-SE? ORA, importo-me sim senhor. Este animal, sentou-se propositadamente aqui, exactamente ao meu lado; sabia que o comboio vai cheio, viu-me montar a tenda, aninhar-me no banco, e digo-lhe que não é fácil….e agora diz-me Importa-se? “Tá” louca?
É CLARO QUE ME IMPORTO.
(Mas claro pensei só para mim.)
Que grande estafermo era o tipo do 46. Quanto a mim, mexi-me (teve mesmo de ser), arrumei a tralha toda (que não era pouca), desviei-me, para o outro “#/%$ passar, e para a outra “lady” se sentar.

9/21/2006

Hipólita (4)

Lá vai Hipólita com grande confiança descendo a rua. Lá vai ela. Chega ao café, sobe as escaditas e lá está ela no segundo piso, sozinha, tentando escolher a melhor mesa. Claro que escolheu a pior, mas é a mesa dela, aquela mesa que apanha com o frio do ar condicionado. Mas nada estava perdido, pois Hipólita levou o seu melhor casaco. Isto era uma visita ao café a sério.
Segue-se o ritual:
-Tira da mala mal cheirosa os óculos (é pitosga coitada).
-Tira da mala mal cheirosa o tabaco.
-Tira da mala mal cheirosa o caderno.
-Tira da mala mal cheirosa o walkman.
-Tiraria da mala a caneta preta (caneta esta que ela fixou o olhar vezes sem conta em casa).
-"A Caneta?"
Mas afinal onde estava a porra da caneta. Posso afirmar, que para Hipólita o caldo estava defenitivamente entornado.
Pior que estragada bebe o seu café (já frio) de enfiada, e sai disparada café fora. Pois o momento pelo qual tanto trabalhou para ser o melhor do dia, estava prestes a ser um verdadeiro inferno, tudo por causa da caneta preta.
Chega a casa, bebe uma garrafa de vinho carrascão de pacote, e dorme estatelada no chão nojento de casa que não é limpo há mais de um mês. Um bocadinho de pó, um ataque de asma,e uma overdose de método fazem daquele dia, um dia condenado.

Hipólita (3)

O facto de uma pessoa se sentir um "lobo solitário", produz em alguns seres humanos efeitos realmente... nefastos. Um caso sério de solidão aguda é Hipólita. Desgovernada por natureza, Hipólita mergulha num excesso de solidão, uma coisa horrenda de se ver. Então como combater a solidão?
-"Diga mais alto... repita lá...."
-"Com método menina, tudo se resolve com método" - gritava um crente qualquer.
Então com método, organização exagerada e atitude, Hipólita sai de casa. Agarra a sua mala mal-cheirosa e velha, enfia lá para dentro tudo a que tem direito. Tudo isto realizado com muita organização. Diante da porta confirma se tem as chaves, pelos menos umas dez vezes, meio pé fora, meio pé dentro, lá vai confirmando outra vez, não vá a coisa dar para o torto.
É óbvio que se seguem um ou dois:
-"Ah, será que desliguei o gás? As torneiras estão fechaditas? Será que está frio lá fora? Será que vai chover? Será que...? Será que...?"
Foi um magote de "Será que"..E passado 10 minutos de:
-Gás, confere.
-Água, confere.
-Qualquer coisa, confere.
Lá sai hipólita de casa. Com atitude, confiança no método e sobretudo esperança de ficar bem disposta.

9/15/2006

A mão

Vai jovem na rua contente.
Vai jovem na rua cantarolando,
e vai sozinha.
Está de noite, está um céu escurinho, e existem umas luzitas verdes que não iluminam nada de nada.
Nessa rua há um Homem. Há um Homem concerteza.
É um homem velhito, bom aspecto, e voz trémula.
Pés protegidos, cabeça pequena, coração grande.
Não era de modo algum um desbocado.
Não era de modo algum um ordinarão.
Era um homem com um grande coração.
Transbordava paternalismo.
"Não vá por aí menina... a rua é escura, E nunca se sabe onde anda a mão de Deus".

Natércia

Natércia anda com um problema muito sério. Nervos, anda cheia de nervos. Uns nervos mesmo grandes. Coitada, já nem faz nada de jeito...ela bem que tenta, mas realmente não consegue. Por ela, a vida era o seguinte:
- empoleirada na janela, e atirar fruta podre terceiro andar abaixo. Isso sim! Isso é divertido. Atirar com fruta na mona das pessoas.
Mas não, em vez disso tocam à porta duas tipas a vender brinquedos a metade do preço para ajudar criançinhas. Incluindo um cão a cantar/dançar Frank Sinatra.
-"Haja paciência."

9/14/2006

Planos

Andou enganado muito tempo,
tinha planos imensos,
nem por isso muito ambiciosos.
mas eram os seus planos.
apenas 3 segundos, e...meia dúzia de palavrecas e..

planos? quais planos? eu nunca tive planos.

9/08/2006

Cremelinda

Cremelinda tem uma vida absolutamente infeliz. Tem uma penca de filhos, um trabalho pesadote, carradas de vícios, uma casa minuscula e óbvio, um marido que é um verdadeiro bandalho...ou seja um farrapo, um individuo sem dignidade, um tipinho absolutamente despreszível e um grande porco! A mulher todos os dias acorda azoinada.
Também não é de admirar, durante a noite leva com as pancadinhas de amor e as mentiras piedosas do marido(que é um porco), com a garrafa de bagaço, que esconde sempre na caixa da farinha (a única coisa que a consola durante o dia e noite) e claro leva aínda com as irritantes criançinhas que não se calam e partem o pouco da casa que existe. Claro, que tudo piorou quando o Zacarias arranjou um pulguento para ir para casa, e pronto, quitoso para o pessoal todo!
Aquela casa é uma balbúrdia, uma bagunça completa. Mas como tudo na vida tem uma solução, esta família também tinha.
Das duas uma, ou Cremelinda pegava nas malinhas e ía embora...Ou...veneno de rato para o jantar.

9/07/2006

Exame de Alfredos

Uma data de Alfredos tinha um exame.
Quatro desses Alfredos decidem na véspera, que não fazem a mínima ideia da hora que será realizado o exame. Através da internet, por telemovél e pelo telefone fixo decidem que alguém terá de ter a RAZÃO.
Será que o exame é ás 10.30...11.00....umm...14.00 talvez ás 14.30. Graças a Deus Nosso Senhor, ninguém se lembrou de duvidar da data.
Mas continuando, um dos Alfredos acreditou que o exame era ás 14.00, outro Alfredo jogou pelo seguro e chegou ás 10.00 e o outro confiou na sorte e só chegou ás 13.00 á Escola.
O exame realmente era ás 14.00. Obrigado Alfredo que teve exame ás 11.00.
No entanto, o que nenhum dos Alfredinhos esperava, é que o Docente, não soubesse nem a data nem a hora que devia dar esse exame. Tudo culpa da secretaria (corre o boato).
Se calhar, os quatro Alfredos baralhados deviam ter ligado de véspera para o Docente, assim pelo menos este ficava informado da data do exame.

Alberto "a besta"

Alberto certo dia ficou um verdadeiro "bicharoco".
Alberto sempre foi muito calmo, muto calminho... até ao dia.
Descrição da vida de Alberto:
- Oh Alberto! Não arrotes.
- Já estudaste, olha os exames! Tu já não mandas uma para a caixa, ora, se não estudas...vai ser bravo."
- Oh Badocha, pára de comer que aínda rebentas, meu gordo.
- Alberto! vai ter alí com a vizinha, paga o pão das duas semanas, e atura-a que ela é uma melga do pior.
- Oh Alberto, troca aí de lugar comigo porque eu estou de costas para a televisão, e quero ver a bola.
- Minha besta, sai daí que não fazes nada de jeito.
Isto foi a vida de Alberto.
Certo dia, acorda muito irritado, e é óbvio o dia não ía correr bem. Manteve-se calmo, mesmo calmo, não abria a boca, não se mexia muito, ignorava tudo. Bebeu para além da conta... 10 imperiais/finos, 2 copos de vinho verde, 2 bagaços...e foi o suficiente. Não farei relatos da cena de violência que ocorreu naquela terra. Sei que da minha janela só vi ambulâncias e pessoas aos berros descontroladas. Mas uma coisa é certa, no meio daquela agonia toda, Alberto sorria... até ficou mais magrinho.

9/01/2006

Hipólita (2)


Hipólita sentiu que andava pesada demais, já se arrastava como uma lesma em estado terminal.
Mas tudo na sua vida exige soluções bastante práticas e Hipólita tinha de voltar a andar direita, não fosse mais tarde sofrer de problemas graves de saúde. Hipólita tem uma capacidade incrivel de visualizar tudo o que precisa, assim procurando bem esta encontrou rapidamente o que de mais pesado tinha em si. Era o emplastro do Coração.
Este estava inchado, com um aspecto miserável, já tresandava o infeliz, mais um bocadinho e o coração agastado arrastar-se-ia como acompanhante ao lado de Hipólita. Era um situação insustentável. Assim, certo dia, Hipólita acorda, e calmamente acorda o seu coração e leva-o para a estação de comboio mais próxima. O seu coração conformado, agarrou na sua mala e no seu chapéu de viagem e seguiu Hipólita. Esta comprou um bilhete de ida e volta - carruagem 3, lugar 14, junto à janela - e abandonou seu Coração naquele comboio.
O comboio parte e Hipólita ficará calmamente á espera que seu Coração volte...