12/30/2006

Solhas

Ando aborrecido, é verdade. E também é verdade, que ando a tentar perceber porque é que estou assim. Mas sim, ando estupidamente aborrecido. Tento de tudo para combater a apatia. Ora vejamos: acordo cedo, acordo tarde; visto-me de preto, uso roupa colorida, ou então fico-me pelo fato de treino ou pelo pijama.
Comecei a ler quatro livros ao mesmo tempo, tentei pintar um quadro (desastre). Para além disto já fui dar pão aos patos, milho aos pombos e amendoins aos elefantes, e nada. Será que uma ida ao oceanário resultava? Ir ver lontras! Não… e nem sequer vou tentar. Já me fartei de comer, já deixei de comer, já experimentei todas as posições possíveis nos sofás, já experimentei todos os canais de televisão, já ouvi todo o tipo de música. Já experimentei queijos de todos os feitios e sabores desde o amanteigado ao da “vaca que ri”, bebi vinhos, tentei beber licores, meti o bacalhau a demolhar, já comprei um molhinho de pencas para amanhã, mas nada, a neurose mantém-se. Já telefonei á família, aos amigos (até para aqueles mais chatos), fui ao café falar com o Tó, e nada.
Mas pior que a neurose crónica dos últimos dias de Dezembro, só a minha dor de costas que não vai embora, o meu pé torcido já há 3 meses e amanhã ter de comer 12 uvas-passas (uma para cada mês do ano novo).

12/27/2006

"Um Coração de Ouro"

"Aulne roçava os muros olhando para trás, com um ar desconfiado, de quatro em quatro passos. Tinha acabado de roubar o coração de ouro do tio Mimile; claro que tinha sido obrigado a estripar um pouco o homenzinho e , em particular, a fender-lhe o tórax com uma tesoura de podar, mas quando há um coração de ouro para sacar não se pode hesitar quanto aos meios(...)"

Um Coração de Ouro, Boris Vian

12/21/2006

As dores de cabeça


“Haja dias como este... haja mesmo...” – pensava Cristovão.
Cristovão, estudante deslocado, corre todos os fins-de-semana norte e sul do país, só para visitar sua estimada família. Família esta acolhedora, quando se diz acolhedora, é porque é mesmo. Todos os fins-de-semana o episódio de sempre:
- um indivíduo de 47 kg, duas pernas, uns ombros fraquinhos e uma “mochilona” (três bolsas, um saco principal, saco este que transporta a roupinha lavadinha, e um compartimento secreto para o dinheiro e B.I), e o problema...onde se enfia a comida para a semana...
Ou seja...
Domingo, comboio exactamente às 19.20, são 18.20, é preciso sair de casa está tudo a postos para enfrentar o trânsito, beijo á mãe, festas ao cão, mochila às costas, quando...
- “OH FILHO, E O POLVO!” – berra a mãe desgovernada.
Que se lixe o Polvo pensou Cristovão, mas que se lixe... o tanas pensou a mãe já de embalagem na mão. Ora...dilema, onde se mete o Polvinho agora... a mochila já estava cheia. Só ao chuto e à lambada se metia tal coisa na mochila. Mas a coisa lá se sucedeu. Cristovão corre desalmadamente em direcção ao carro e passado minutos chega à maldita estação de todas as sextas e domingos. Chega e parte, chega e parte, sempre assim... que fazer, ele odeia a família adora!!
Chega à estação, sai do carro rapidamente, pede 5 euros ao pai, um “até sexta, eu ligo quando chegar a casa”, e pronto começa a correria. Linha nove, “ai não... estou atrasado”.
Corre, corre, corre... quando ouve um estrondo no chão, nem quer acreditar que foi da mochila dele que caiu qualquer coisa, mas é óbvio, cai o Polvo. O Polvinho, que não sabia estar quietinho, rebolou estação fora, enquanto Cristovão desengonçadamente o perseguia com toda a convicção do mundo. Atirou-se a ele (ao POLVINHO) mesmo de cabeça, agarrou-o com os dois bracinhos e rezou uma oração qualquer para não perder o transporte.
Já á última da hora entrou no dito cujo, e enfiou o primeiro dito cujo na mochila.
A viagem... a viagem foi um martírio, pois Cristovão estava sempre a ver, quando a embalagem se abria e começava a pingar na cabeça ou no portátil do morcão que ia sentado mesmo por baixo do bicho.
Alivio, dos alívios...chega a casa, congelador, tacho e jantar. Soube-lhe bem como tudo.

12/10/2006

Domingos

Aos Domingos...

Aos Domingos familiares.

Aos Domingos de televisão.

Aos Domingos de tricot.

Aos Domingos de leitura.

Aos Domingos de visitas ao museus (das 10 à 13).

Aos Domingos de tédio.

Aos Domingos de trabalho de última hora.

Aos Domingos de ida ao Shopping.

Aos Domingos de missa.

Aos Domingos de neura.

Aos Domingos de sono.

Aos Domingos de arrumar a casa.

Ora Domingos, o pior deles... é seguramente serem o dia anterior à segunda.

12/03/2006

O tipo

Há dias que um tipo nem se devia levantar da cama, nem devia abrir os olhinhos, nem colocar o dedinho e o nariz fora do lençol para medir a temperatura ambiente.
Mas a teimosia levou-o a:
- que a partir das 21.40 começasse a chover e a água entrasse pela chaminé, e caísse exactamente a alguns centímetros dos tachos onde fazia seu precioso jantar…
- que exactamente ás 23.08 acabasse o álcool…
- que se apercebesse lá para as 23.10 que o DVD do “Pulp fiction” estava estragado…
- que exactamente á 00.20 fumasse o último cigarro.
Sendo assim o tipo ás 03.00 da manhã, andava de esfregona a limpar aguinhas do W.C, porque a água entra pelas janelas quando chove a sério…e é água que não se pode, e se cai água nos vizinhos, é um sarilho. E andava o tipo nestas limpezas, sem álcool, sem tabaco, um monte de nervos escangalhados.
No dia seguinte insistiu em levantar-se e perdeu um conjunto de fotocópias cujo valor era de 8,95 euros, e perdeu-as num abrir e fechar de olhos, porque não dormiu nada, andou irritado o dia todo e não fez nada do que queria. No dia seguinte é óbvio acordou com cinco mamutes em cima, e lá ficou estendido sem remorsos.