10/12/2006

"A jangada de Medusa" - Hipólita (7)



No mundo de Hipólita, o livro tornou-se uma companhia. No mundo de Hipólita, um quadro assume uma dimensão real. Então... vendo um livreco de Arte, repara na “Jangada de Medusa” de Gericault, um dos quadros Românticos de todo o sempre. O sofrimento humano por excelência.
Corpos quase nus, conturcidos, angustiados, num misto de esperança e de derrota.
- “Que coisa medonha? Aquilo é ridículo. Se fosse taxista diria, morra meu filho...assim não paga imposto...não paga não.”
Mas a coisa não funciona assim, aquilo é sofrimento à séria, sofrimento geométrico de composição do quadro, cada elemento sugere uma evolução de desespero, começa nos catetos e acaba na hipotenusa (mentira para quem conheçe o teorema de Pitágoras).
Mesmo assim, era começar numa ponta e acabar na outra, que vergonha era baixar a cabeça naquela situação... afinal, foi só um naufrago, que acabou com dez pessoas numa jangada a implorar por um salvamento... mas isto, é o pão nosso de cada dia, de todos nós...”Alguém nos acuda!!!”
Assim Hipólita, imaginou... -”Que poderia fazer eu, para auxiliar os meus semelhantes?” – No máximo, levar um café e umas sandes de queijo da serra, e talvez uma almofadinha, uma mantinha para a espera ser mais confortável.”
- “Mas alguém desliga aquela luzinha para onde eles olham com esperança? Aquilo é um foco, meus nabos...” - Pois esperança é só para os crentes, e estes se fossem crentes não imploravam...porque à partida já estavam salvos pela bóia de Deus!”
Hipólita, nem pensou mais no assunto, era óbvio que aqueles senhores já estavam perdidos, não acreditavam em nada, só na luz, e a luz não é Deus de certeza.” Desistiu de chamar o S.O.S, era óbvio que eles íam morrer na jangada. Sem café, sem mantas e almofadas. Mas é claro que Géricault não pintou isso (para grande indignação de Hipólita).